A dificuldade em dizer adeus
- Rafael Fernandez
- 5 de jun. de 2020
- 3 min de leitura
O MMA é um esporte novo comparado a outros relevantes, como boxe, futebol, basquete etc. Mesmo com antecessores como o vale-tudo no Brasil e o Pancrase no Japão, foi só em 1993, com o primeiro UFC, que a prática foi verdadeiramente oficializada. Por ser tão jovem, nos dias de hoje ainda há muitos atletas que lutam desde a década de 90 e início dos anos 2000.

Luta entre Maurício Shogun (de branco) e Minotouro (de preto) no Pride, em 2005. Foto: Zuffa LLC/ Getty Images
Muitos desses lutadores são lendas vivas e já alcançaram todo o sucesso possível na carreira. Então por que escolhem continuar na ativa? Durante a semana, saiu uma notícia sobre a terceira luta entre os brasileiros Maurício Shogun e Minotouro, planejada para acontecer no dia 25 de julho, na famosa e esperada "Ilha da Luta" do UFC.
Ambos os atletas estão no final da carreira e, não demonstram aspirar vôos maiores, nem parecem ter mais gás para isso. Shogun luta desde 2002, enquanto Minotouro começou no esporte em 2001. Quase 20 anos de carreira para cada um, o que é bastante tempo num esporte tão brutal quanto o MMA. É difícil entender o motivo de estarem na ativa ainda, já que os dois sofreram muitos danos durante a trajetória no esporte com quatro derrotas por nocaute para ambos.
Não são só os nocautes que prejudicam a saúde, deve-se levar em conta também as inúmeras guerras protagonizadas por eles. Shogun participou de uma das maiores lutas de todos os tempos contra Dan Henderson no UFC 139, em novembro de 2011. Uma verdadeira batalha, na qual o brasileiro saiu com o rosto todo inchado.
Shogun já alcançou o maior objetivo na sua carreira quando se tornou o campeão meio-pesado do UFC, em 2010. Em abril de 2011, foi derrotado por um jovem wrestler americano chamado Jon Jones, numa luta de um homem só. Jones triturou o brasileiro naquela noite e, desde então, o ex-campeão não reencontrou a forma. O queixo, que costumava ser de pedra nos anos 2000, sucumbiu e as últimas três derrotas foram por nocaute.
Shogun é mais jovem em comparação a outras lendas ainda na ativa. Enquanto a maioria já está nos 40, o ex-campeão tem 38 anos. O problema do curitibano é o acúmulo de golpes. O estilo agressivo e da trocação em pé franca, originário da equipe Chute Boxe, infelizmente resulta em uma carreira menor em altíssimo nível. Mesmo ainda empregado pelo UFC, seu nível de competição passou a ser lutadores no top 15 e fora dele.
Minotouro, por outro lado, nunca teve uma grande conquista no MMA e sempre esteve na sombra de seu irmão gêmeo, Minotauro. O menos conhecido dos irmãos Nogueira já está com 44 anos e, de suas últimas quatro derrotas, foi brutalmente nocauteado em três. A derrota em que não foi finalizado, foi uma guerra de três rounds com o próprio Shogun.
Assim como Shogun, Minotouro está longe de ser o mesmo e, sinceramente, já deveria ter se aposentado há alguns anos. Mas a cabeça do lutador é diferente, é difícil para ele admitir que não dá mais. Lutar é a vida deles, o emprego deles e o que lhes trouxe fama. O que fazer quando parar? Essa incerteza é o que faz muitos continuarem, além, claro, do orgulho e da teimosia por acharem que ainda conseguem se apresentar em alto nível.

Shogun recebendo o cinturão dos meio-pesados, após derrotar Lyoto Machida no UFC 113. Foto: UFC/Reprodução
A escolha da aposentadoria é dos lutadores, mas algumas vezes é necessário que pessoas próximas o ajudem a tomar essa decisão. Esse tópico é semelhante ao texto sobre "nunca jogar a toalha", pois o atleta sempre vai ser seu maior adversário e algumas vezes é dever da família, treinadores e amigos salvá-lo, mesmo que seja algo que ele não queira.
A saúde sempre tem que vir em primeiro lugar. Quantos já sofreram as consequências dos danos da carreira no boxe por simplesmente não terem aposentado mais cedo? O MMA, por ser tão jovem, não tem tantos exemplos, mas existem. O veterano Gary Goodrige sofre de encefalopatia traumático crônica, devido a golpes sofridos na sua carreira no MMA e no Kickboxing.
Lutadores como Shogun, Minotouro, Vitor Belfort e tantas outras lendas ainda na ativa nunca perderão os seus postos na história do esporte. Eles não precisam provar mais nada a ninguém e nem para si mesmos. Algumas vezes, a maior conquista da carreira é saber quando dizer adeus e poder desfrutar a vida sem complicações.
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